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...um conjunto de cadeiras de praia, t-shirts caveadadas, um baralho de cartas sebento e joga-se a bisca lambida: se a senilidade é um drama, a senilidade em grupinho de amigalhaços de imaginação pífia é ainda mais deprimente.
Quero trabalhar, mas estou desconcentrada. Há uma hora que me procuro lembrar do grego (seria pré-Socrático?) que dizia que devíamos prescindir dos amigos para ser virtuosos. Sei que soa a coisa próxima a Sócrates, mas não é ele que procuro. Às tantas não é grego. Talvez algum estóico maluco, como o Séneca? Noutro dia confirmo.
Não vou tão longe quanto isso, mas o bom de não conhecer ninguém - ou muito poucos, digamos assim -, é que se pode dizer as coisas a direito sem remorsos de estar a ferir algum conhecido. Num país onde todos são amigos de todos, todos estão de mãos atadas. A menos que sejam corajosos, evidente.
Leia-se a mesma notícia no The Guardian: North Korea Covid-19 outbreak fears after Kim Jong-un warns of ‘huge crisis’ in ‘antivirus fight’ e no Público: Kim Jong-un critica “incidente grave” relacionado com a covid-19. Apesar da forte inspiração, os ingleses conseguem sempre dizer o têm a dizer de forma inequívoca, tirando as devidas ilações. Coisa que por cá se teme. Faz toda a diferença.
A razão para recorrer ao The Guardian - conotado com os Trabalhistas - tem uma justificação simples. Fazendo uma consulta parcimoniosa: abrir quatro ou cinco notícias de cada das duas vezes por semana que o consulto permite continuar a ter acesso gratuito. Não me importaria de passar os olhos pelo The Daily Telegraph - próximo dos Conservadores. Sucede que não o posso fazer sem pagar e não estou para aí virada.
Nas próximas semanas vou investir no The Independent - conotado com os Conservadores e Liberais -, que também tem acesso gratuito.
Imagino que ontem com a detenção de Joe Berardo muitos tenham ficado com a mesma sensação. O desconforto de saber que tudo se passou nas nossas barbas - o assalto ao BCP e a forma como aconteceu foi denunciado por muitos à época dos factos e ainda assim foi possível a impunidade temporária e o desplante a que todos assistimos anos depois na Comissão de Inquérito.
É sensação recorrente. A de ter razão antes do tempo e de não ser ouvido a tempo de se por travão na vilanagem a descoberto. Sejamos lúcidos: ninguém acredita que Joe Berardo vá devolver mil milhões - quanto mais não seja por não os ter.
Já o sentimos noutras circunstâncias e com outros protagonistas. A Investigação Criminal e a Justiça – que apesar de tudo melhoraram – a correrem bem irão servir de mero consolo, mas não reverterão os danos provocados.
O olhar entre o vazio e surpreendido que os homens e as mulheres de acção deitam aos melancólicos que rememoram factos da vida passados na infância, na adolescência ou há uma década, espelha a confusão que lhes faz perder tempo com coisas que foram e já não movem. Estão habituados a tomar decisões, a planear o dia de amanhã, a gerir objectivos, o tempo e o espaço, e as pessoas. As pessoas estão no rol de circunstâncias favoráveis ou desfavoráveis aos objectivos que determinam para aquele dia, aquela semana ou mês. Como uma construção de lego, as peças têm que encaixar, seja qual for a sua natureza, em prol do resultado final.
Estamos habituados a admirar os homens e mulheres de acção. Sobressaem na sociedade. São os que constroem ou dirigem empresas, os presidentes de fundações, associações e clubes, os que dirigem escolas e hospitais, os líderes de várias entidades. Em regra, são pessoas extraordinariamente ambiciosas no sentido benigno ou maligno da coisa. Benigno se consigo transportam ideia firme do que é justo, maligno no caso contrário.
São objecto de inveja pelos motivos errados. Muitos consideram que têm vidas fáceis e apontam as suas regalias e privilégios. Esquecem que, grosso modo, é gente com grande capacidade de trabalho e que se empenha e labuta com afinco. Gente organizada, disciplinada, com espírito de sacrifício.
O mal não está no não serem capazes, mas no facto de em muitos casos não serem justos. Por falta de tempo e hábito de perceberem os outros como iguais. Os homens e as mulheres de acção partem do princípio que os outros são ferramentas vulgares e, na maioria dos casos, sem grande préstimo individual, salvo se forem bem orientados. Ferramentas prontas a ser usadas para sucesso da empreitada. E dividem os outros entre os que trazem vantagens e os que prejudicam. Esquecem com frequência que a maioria dessas ferramentas também são homens e mulheres de acção, no sentido em que dia após dia, trabalham e se dedicam, com a diferença fundamental de não se alçarem à categoria de líder por falta de talento ou de oportunidade.
Desde criança reparo nos homens e mulheres de acção: vi-os no auge e na decadência. Fico com a sensação que em muitos casos à medida que envelhecem começam a criar um círculo de vazio em seu torno - de alheamento da realidade. Como se o tempo e espaço viessem pedir contas tarde demais, abandonando-os num mundo desabitado de ferramentas – de pessoas com alma e sentimento.
Obrigada, Pedro.
Ainda a processar.
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Levanta questões interessantes, mas as conclusões são forçadas. Há momentos em que se pode equiparar a um Ayatollah ou a uma Madre Superiora. Um obstinado.
Na primeira semana de Maio propus-me mudar de empresa. A única condição que impus (e não foi pouco) é que não saísse do Porto, apesar da empresa para onde concorri estar sediada a 330 km. Depois de renhidas negociações, nas quais fico com a vaga sensação de ter sido (talvez felizmente) mais espectadora do que interveniente, tive hoje a confirmação de que passarei no próximo mês a trabalhar em duas empresas: naquela em que já me encontro e na que me propus.
Há quem arranje empregos e há quem arranje trabalho em duplicado.
No fundo, creio que depois de muitos anos de trabalho frenético, este último ano e meio mais sereno estava a confundir-me e a deixar-me tempo para os devaneios das Comezinhas. É possível que volte a ter pouco tempo para respirar e, nesse caso, o blogue fique mais sossegado.
Noutras alturas estaria em polvorosa. Hoje sinto-me serena. Consultei os astros (risos) e dizem-me que vai correr tudo bem. Porque não acreditar?
Este é o tipo de postal que as pessoas normais (sérias, profissionais, ponderadas, plenas de siso, bem-sucedidas) jamais fariam, mas dá tanto gozo. ;)
No dia em que os medíocres do costume vão cair em cima do seleccionador, quero agradecer-lhe a vitória do Campeonato da Europa de 2016.
Possivelmente estará na altura de mudar de seleccionador, mas haja memória e gratidão.
Cresci a contar com os remoques familiares face à pretensão. Tudo quanto na linguagem fosse pires, a armar ao pingarelho era motivo de chacota. Recordo bem a referência antiga aos tiques de professora de liceu. Era uma referência jocosa às pessoas que empregavam termos caros nas conversas banais. Isto ao mesmo tempo que se valorizava o vasto leque de vocabulário em cronistas e escritores.
Volvidas décadas pondero sobre o ponto de equilíbrio nesta matéria. Reparo na pobre linguagem verbal e escrita, onde são aceites todos os termos de maré – e as marés da linguagem hoje podem ser mensais ou semanais – de tal modo que se num qualquer dia nos dedicarmos a ler duas dezenas de crónicas de autores diferentes, topamos com vocábulos repetidos à exaustão, como se decalcados de uns textos para outros.
Não sei se a ideia presente de que se deve estar em cima do acontecimento, o medo de parecer alheado da realidade leva quem escreve a esta necessidade de encosto na maioria. Sinto que é uma coisa inconsciente e isso, para ser franca, ainda é mais assustador. Onde andará a consciência e o cunho de cada um? Não só os temas têm que ser os do momento, como os termos, as expressões, as interjeições. Tudo comove todos por igual. Ou melhor, comove por igual as tribos. As pequenas divergências que existem são de facção, se bem que os termos empregues até são os mesmos, só que devidamente inquinados em função do ponto de vista do bando.
Habituada a ser chamada à atenção por uns por usar termos antigos, e por outros por usar termos aperaltados, pergunto-me se todos temos de escrever como se fossemos um misto de psicólogo e jornalista a redigir a acta do condomínio.
Serão vídeos com balelas, mas são as balelas que nos mantém em pé.
Isto é só um jogo.
... do Palhinha.
Em Setembro fará dois anos sobre a primeira consulta no Santo António com vista à cirurgia bariátrica, no caso o bypass gástrico. Seguindo o ritmo dos últimos quinze anos – aliás acelerando – no último ano consegui a proeza de ganhar mais quase dez quilos. Além das razões óbvias que se prendem com o comer em excesso e estar sujeita a medicação que potencia o aumento do peso, creio que o que mais tem contribuído para o descalabro são as minhas ideias geniais para dietas: a cada mês ou trimestre uma nova. A última panca foram os batidos, não os de fruta - essa fase já me passou -, mas estes baratos que se vendem no supermercado – e há bem caros no mercado fashion das dietas.
Admito que às vezes sonho acordada que toca o telefone e é do Santo António. De lá alguém me pergunta se aceito ser já operada face a desistências ocorridas. Depois acordo e caio na real: só nos primeiros meses de 2022 é que tratarei de fazer a cirurgia que me começará a extirpar a irmã gémea que trago acoplada contra vontade. E só aí terei ajuda – a efectiva solução, a motivação externa de que preciso – para recomeçar uma vida com hábitos alimentares saudáveis. Sejamos optimistas: já faltou mais. Na verdade, foi tanto na minha vida o que surgiu com atraso de décadas - e disso resultaram danos irreparáveis. A vida é como é, há-que aceitá-lo. As facilidades e doçuras não gostam de comparecer por estas bandas. Nada que não digamos todos: somos uns mártires. Claro, uns mais do que outros.
Neste compasso de espera – contingências de quem não está habituada a furar filas e aguarda paciente a sua vez - começa o ciclo: hum, se substituísse as refeições por batidos; hum, se comesse sopa sem batata e fruta; hum, se seguisse o sensato programa da nutricionista; hum, se deixasse de comer pão e queijo; hum, se usasse a elíptica regularmente. Pois, já tudo foi pensado, já tudo foi experimentado. Por muita razoabilidade haja nos conselhos que apontam para o equilíbrio e os hábitos saudáveis, o certo é que cada um é como cada qual, e não me recordo de nenhuma vitória significativa minha que não tenha passado por uma atitude radical de entrega, de risco e renúncia.
Espero e desespero pelo dia em que diga: Não! A partir de hoje é à séria. E seja.
Portugal não é de todo o país que conheci em criança. A viver no meio rural por circunstâncias fortuitas, habituada à cidade aos fins-de-semana e acostumada às viagens por todo o território nacional nas férias, não era comum a presença em massa de estrangeiros, salvo turistas nalgumas regiões.
Razões profissionais levaram-me a passar as últimas duas décadas a falar diariamente não só com nacionais, como com estrangeiros residentes no país. O compliance e a decência (não sei se ainda é possível usar esta palavra sem nos envergonharmos) impede-me de dar eco dessas conversas. Mas há outras cavaqueiras tidas com estrangeiros na vida pessoal corrente que sempre me atraem. Sendo utilizadora da Uber e da Ubereats, de alguns restaurantes e de barbeiros e cabeleireiros, começo a ter alguma ideia da vida, das alegrias e dificuldades quotidianas dos estrangeiros em Portugal.
Na semana passada o (último) barbeiro do Nuno, um jovem brasileiro de origem nordestina a viver em São Paulo, antes de há três anos ter decidido vir para o Porto, contou-nos como estranhou pela positiva os primeiros meses a viver cá. Relatava ele o seu espanto quando à noite se cruzava com raparigas de telemóvel na mão que não ficavam a fitá-lo com medo, nem atravessavam de passeio ou aceleravam o passo. Aqui nem reparam em mim, dizia estarrecido. Por ser homem de pele escura estava habituado a esse comportamento no Brasil. Aliás, contou-nos que na sua cidade, quando miúdo, era habitual haver ordem de recolher nocturna imposta pelas máfias locais.
Disse ser um homem feliz por ter encontrado paz e segurança no Porto. Contou-nos que sempre se sentiu desajustado na terra onde nasceu e aqui se parece ter encontrado – fez uma série alusões espirituais que me vou escusar relatar por pudor. Recordo apenas por graça, a referência à mãe – que alertou nada saber sobre Portugal – a quem só contou estar cá, depois cá estar. Muito renitente com a mudança de vida do filho para tão longe, perguntou-lhe porque tinha vindo para essa terra de terramotos. Só sossegou depois do filho lhe contar que as pessoas são muito bem-educadas e se pode andar na rua – até à noite – com telemóvel e relógio no pulso.
Com relação aos tempos de pandemia e às dificuldades provocadas pelo fecho do estabelecimento por tanto tempo, brincamos apenas com o destino que daria aos 50 euros que a Segurança Social lhe atribuiu como compensação.
E não posso deixar de referir o carinho pelos Açores. Estando cá há tão pouco tempo já foi visitar São Miguel três vezes e está absolutamente encantado com a ilha. Aliás, tem aproveitado para conhecer Portugal enquanto espera a legalização como cidadão estrangeiro residente no nosso país, para depois ir conhecer o resto da Europa.
Quanto ao cabelo do Nuno, à segunda já ficou melhor. Digamos que o primeiro corte foi um pouco arrojado. Só o bom feitio do cliente nos levou de regresso àquela casa. Em boa hora.
Uma camadona de sono, que não vos digo nem vos conto. Mas isso em mim é normal. Digamos que toda a vida tive uma relação muito íntima, profunda e duradoura com Morfeu. O tal que resolve quase todos os males.
Por agora não há sintomas a registar além do sono e da incapacidade para fazer um postal que jeito tenha - bom, este parece-me um sintoma já com lastro.
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