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Draw With Me

por Isabel Paulos, em 31.07.22

Ao longo da semana li e ouvi duas referências à falta de maturidade de certos jovens. Em ambas as ocasiões pude constatar o absurdo de rotular de infantis comportamentos só por não se enquadrarem na linguagem correctinha da psicologia barata, cheia de lugares-comuns e ideias preconcebidas do que deve ser o mundo adulto. Confundem maturidade com adesão a quadro mental e linguagem palerma de tão aparente sinal de emancipação, independência e perfeição nas relações humanas.

Dramático é verificar que quem tem idade para educar, deseduca. Triste é não dar espaço ao crescimento livre. Assustador é temer a ingenuidade e confundir maturidade com pura adesão à sofisticada palermice dominante, à fantasia do mundo plástico na moda, que alguns tomam por virtuoso, querendo impingi-lo à força às gerações mais novas.

Diário

por Isabel Paulos, em 31.07.22

Dois dias diferentes, dois dias iguais.

Ontem, tarde e noite em reunião familiar com espaço, água para nadar, conversa plena de cumplicidade e picardia. Mãe, irmãos, cunhada, primo, sobrinhos, Nuno e eu (e cão). Alegria, riso. E, no momento em que duas borboletas nos sobrevoaram, vejo um dos meus irmãos abrir os braços, como quem abre as asas. Imóvel, como em criança fazíamos para que as borboletas pousassem nas pontas dos nossos dedos. O certo é que elas pousavam. Fim de noite de troca de mensagens com velhos amigos, depois da qual adormeci no sofá, onde acordei hoje perto das dez horas.

Amanheci com mais mensagens bem dispostas de amigos cheios de grandes ideias para jantares e viagens. E de troca de informação útil. À tarde a má notícia. Partimos para Braga para a despedida da tia N., que deu exemplo de vida ao encarar os seus últimos e difíceis anos com coragem, sempre afirmando: "amanhã é outro dia". Em momento algum se deixou perder para a autocomiseração, que destestava. Para ela já não será, mas para o meu tio e primos amanhã será outro dia duro, triste, difícil. Espero que a força do elo, a ideia de que somos uma rede sólida que está cá para as alegrias e para as tristezas atenue um pouco a dor. De uma coisa podem estar certos: a tia N. era adorada pela família. Vai-nos fazer muita falta, ainda que saibamos que vai para junto de pai e mãe.

A presença de espírito da tia N. era notável. Em criança num dia mau a minha mãe, terminada uma discussão, disse-me que tínhamos fazer as malas. Ora, bem mandada e um bocadinho calhau, fui para o quarto arrumar as minhas trouxas em sacos, já que íamos deixar Valinhas. Não fosse a chegada da tia e o seu pragmatismo a sossegar-me com toda a calma do mundo que não íamos a lado nenhum e aquilo era só uma má disposição passageira, esse dia teria sido bem mais difícil. Amanhã é outro dia, e foram muitos outros dias em Valinhas e Lagos com a exuberância, genica, criatividade e boa disposição da tia N., que me incutiu o gosto pelas mudanças de casa e jogo de cartas, nos quais não tolerava batota. Honestidade total à mesa de jogo como na vida.

Sábado

por Isabel Paulos, em 30.07.22

IMG_20220730_195751.jpg O meu sobrinho Tim. Um dia esplêndido. 

Recapitulando

por Isabel Paulos, em 30.07.22

Socorro, o mundo é gigante

por Isabel Paulos, em 16.07.21
 

Se há o hábito de pensar na vida, fatalmente se chega à conclusão que o mundo e o conhecimento sempre estarão além. Com maior ou menor felicidade todos os dias se argumenta, todos os dias alguém se debruça sobre fracção ínfima do Universo e tira conclusões. Ainda que tenha o cuidado e a seriedade de questionar o que é preconcebido no raciocínio e aquilo que passa ou não o teste de validação de veracidade, esta será sempre parcial. No dia seguinte, talvez no próprio dia, quando não no exacto momento em que se acaba de proferir a afirmação original, se a postura for honesta, outros raciocínios irão contradizer o pensamento inicial. A procura da verdade é um processo difícil e doloroso, em que a todo o momento se é confrontado com as próprias contradições.

E se há mais de dois milénios no Ocidente – no momento em que surgem os primeiros questionamentos e arranjos filosóficos - parecia possível chegar-se a uma concepção do mundo satisfatória, hoje a tarefa é monumental. Não só o conhecimento do mundo físico aumentou exponencialmente, como os processos de intelectualização do pensamento se foram complexificando de modo absurdo.

E nem é preciso recuar tanto. Se retrocedermos aos séculos imediatamente anteriores - ao tempo das enciclopédias -, percebemos como havia genuína intenção de conseguir reunir em obras mais ou menos extensas todo o saber do Universo.

Onde parará este optimismo e ingenuidade quando comparados com a estupefacção face ao fluxo massivo de dados, informação, conhecimento e sabedoria actualmente à disposição da população mundial? Será que a maioria apenas conseguirá ter a percepção dos dados e da informação – forçando muito a barra, como diriam os brasileiros: o seu julgamento viverá nas sombras da caverna de Platão – e só uma minoria alcançará o conhecimento e sabedoria – ousando mais uma vez: acederá à realidade fundamental das formas ou ideias.

Porém, a questão é: face ao gigantismo da realidade a conhecer, será possível chegar à Verdade, dada a dificuldade de obter uma concepção que explique de forma satisfatória o Universo, o seu funcionamento e o sem-número de ideias que sobre ele versam?

A atitude de alguns é a de se alçar ao patamar do conhecimento e da sabedoria, pisando os que pressupõem a eles não conseguirem aceder, não tomando consciência da fragilidade do próprio conhecimento. Raramente vejo os bem-pensantes admitir erros e contradições. Salvo em falso discurso para dar o ar de tolerância – quando não de condescendência sobre os pobres néscios. Raramente confessam as suas fragilidades e não parecem perceber que sem o fazer não têm ossatura nem o direito de apontar erros a terceiros. Ora, a prosápia é a forma mais infame de desconhecimento – os que têm a possibilidade de aceder ao conhecimento, têm obrigação de perceber os mecanismos de construção do pensamento; têm maior responsabilidade. Sucede que não raro, ao menos em Portugal que é a realidade que conheço, foge-lhes o pezito para a pura maledicência e presunção sem fundamento – se é que alguma vez a presunção pode ter razões de base atendíveis. Perdem-se em injúrias contra a ignorância atrevida, a ignorância voluntária; em suma, contra a estupidez. Odeiam o mundo da discussão das massas, ficam de pêlo eriçado quando observam uma mulher ou um homem fora do mundo académico, fora do gueto de amigos intelectuais, fora da tribo daqueles que preconcebem como pessoas que se podem ouvir ou ler. Nuns casos, a arrogância é de tal modo doentia que são incapazes de escutar ou decifrar o que dizem os anónimos por falta de pedigree (e por contraposição aos peões dos palcos formais e institucionais do conhecimento), noutros a falta de seriedade é de tal ordem que ouvem e lêem estes homens e mulheres desconhecidos e aproveitam abusivamente os seus contributos, sem jamais os considerarem como iguais ou reconhecerem a validade do seu pensamento.

A título de exemplo, esta arrogância face ao presente texto ditaria qualquer coisa do género: olha, uma atrevida ignorante a tentar numa passagem dar o ar de inteligente, com paralelo infundado e desajustado a Platão sem perceber nem aprofundar, por ignorância voluntária, o estudo da obra. A presunção exigiria três citações, quatro referências bibliográficas e uma menção a amigo interessado rotulado de eminente pensador, para que o texto pudesse ter validade. Quando a simples abertura de espírito e humildade ditaria que antes de etiquetar o presente texto como lixo, se pudesse talvez vislumbrar numa simples linha ou par de palavras, um pequeno e modesto rastilho para pensar.

Mas não, o julgamento será: é muito atrevimento, muita ignorância, muita estupidez.

O mesmo acontece aos incalculáveis milhões de observações de desconhecidos encontradas no espaço online. A mais pungente manifestação da Democracia – as redes sociais -, não é necessariamente um esgoto a céu aberto como tantos querem fazer crer. As redes sociais têm muitas fragilidades, mas estão expostas e as suas falhas são na maioria das vezes assumidas pelo pensamento dominante. Ao contrário das debilidades de quem só conhece livre pensamento (esclarecido) nos canais recomendados, tantas vezes por critérios pouco claros e pouco honestos. Na melhor das hipóteses, por medo de ser engolido por essa onda gigante de opinião.

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Mario Vargas Llosa

A Civilização do Espectáculo

por Isabel Paulos, em 29.07.22

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Yonder Mountain String Band

Into the Fire

por Isabel Paulos, em 29.07.22

Mais uma semana. Mais um mês (útil). Ufa.

Os próximos dois dias adivinham-se bem-dispostos.

Bom fim-de-semana. Divirtam-se.

Estabilidade

por Isabel Paulos, em 29.07.22

Conheço várias pessoas, sobretudo mulheres, para quem a entrada dos 30 foi uma marca muito positiva. Por razões de realização profissional ou pessoal. A conquista de estabilidade no campo da formação ou laboral e de constância na relação afectiva, máxime a vinda de filho ou filhos, fez desse período uma marca memorável. É certo que nos dias presentes esses objectivos de vida são cada vez mais postergados.

Como já por aqui aflorei casar e ter filhos, um desígnio apesar de tudo ainda muito comum na minha geração, não era um sonho meu de adolescência. Para mal dos meus pecados, Deus fez o favor de me dar na casa dos 20 e início dos 30 a vida que idealizei em miúda em traços muito mal amanhados - é o que dá não definir bem o que se quer, Deus apanha o esboço e despacha o pedido sem grande cuidado, à trouxe-mouxe. A bem da verdade admito que na próxima encarnação vou escolher ser mais "normalzinha". É que parecendo que não o mundo está montado para pessoas standard, não se compadecendo de esquisitices. Além de mais é muito confortável aparecer nas reuniões familiares e de amigos devidamente acompanhada, e de preferência com a mesma pessoa durante longos períodos. Dão-nos muito mais crédito. É tudo muito mais tranquilo e sereno. Muito conveniente. Quando nos apresentamos sós, teremos sempre alguma pecha, especialmente se formos mulheres: encalhadas, vadias ou fufas. Vá estes são os três rótulos mais comuns. Aos catalogadores não passa pela cabeça consultar a astrologia, senão logo dariam conta que há gente com tendência para o celibato ou para amancebar tarde. Gente manienta cujos astros se alinharam de modo a levarem a liberdade muito ao pé da letra, fazendo finca-pé em não abrir mão da sua quota de independência. Ou então e quanto mais não seja por puro mau-feitio. Má-língua por má-língua podiam usar as bruxarias em vez dos anátemas herdeiros da claustrofobia imposta por interpretações estreitas da tradição religiosa. Não andam tão longe assim e os astros apesar de tudo parecem ter mais abertura de espírito.

A chegada aos 30 pedida por muito conturbada não foi particularmente feliz. Até lá nem estabilidade profissional nem emocional. O meu primeiro contrato sem termo foi aos 33 anos e só juntei trapinhos aos 41, depois de quatro anos de namoro com o Nuno em segundo round, já que nos havíamos conhecido e namorado quando tinha 26/27 anos. Até então tudo o resto foi desarrumação de vida e navegação à vista.

Só depois dos 35 serenei e pela primeira vez na vida me senti compreendida e capaz de me dedicar por inteiro a outra pessoa, fazendo-a centro da atenção, preocupação e amor. A entrada nos 40 foi bela e feliz por essa razão. Vivida intensamente, sem a desordem da entrada nos 30, sem a inconsequência dos 20.

A aproximar-me dos 50 (falta menos de ano e meio) volto a focar-me mais em mim e na preparação da maturidade - esta só de gozo, dita por uma criançola. Introduzi uma série de pequenas alterações na vida para me sentir melhor. Com esperança, mas nunca a certeza, de seguir pelo caminho certo. Ainda há mais mudanças no encalço, como tanto gosto.

Depois de acabar de escrever este texto voltei à sensação de estar a descrever a vida de muitos, aliás, de muitas outras mulheres. Às tantas é só necessidade de me sentir acompanhada.

Cigarros

por Isabel Paulos, em 28.07.22

As imagens das marcas de cigarro que fumei.

Comecei a fumar cedo. Demasiado cedo. Depois de umas passas aqui outras acolá, comprei o primeiro maço no dia que fiz 14 anos – um SG Ultra Lights. Dia de uma decisão difícil. Esse pacote ao menos durou quase um ano. Mas aos 15 já fumava um maço por dia e assim me mantive até aos 40,  quando dei por mim a dar cabo de cerca de 30 cigarros por dia. No liceu, entre o 10º e o 12º ano fumei SG Filtro e Gigante. Coisas levezinhas, como se vê. Uma estupidez. Ainda por cima filha de pais que davam o bom exemplo, não fumando senão muito raramente (e sem travar, coisa que nunca percebi como se consegue fazer). O certo é que três dos quatro filhos não seguiram o bom exemplo, preferindo aderir a hábitos perpectuados pela família alargada e amigos. Dizem que em criança pequena andava atrás das tias fumadoras, de lápis de cor e afia nos dedos, a fazer as vezes de cigarro e isqueiro tratando-as por tu. O máximo, devia achar na qualidade de macaca de imitação.

Nunca gostei de Marlboro apesar de ter fumado algumas vezes, quando fora do país. A primeira em 1990 no sul de Inglaterra, quando lá estive umas semanas sozinha num curso de Verão (um dos melhores presentes que recebi na vida). Nessa altura também fumei John Player Special, a marca mais barata do mercado – foi com esta referência que lá no aeroporto me entrevistaram num inquérito sobre hábitos tabágicos. A última vez em Luanda em 2005.

Na faculdade passei ao L&M e não sei se o Português Suave é desse tempo ou posterior – tenho falhas de memória. Salvo épocas de exames e orais, continuei na média de um maço por dia, muito expandida nessas alturas. Depois aderi ao Chesterfield Lights, que me acompanhou vários e os mais difíceis anos. Fiz três tentativas de deixar já a trabalhar. Uma em 1998 numa viagem aos Estados Unidos, conseguindo estar três semanas de abstinência, até acabar por comprar maldito Marlboro. E duas mais tarde, de cerca de 10 meses cada, uma delas também por imposição de estar fora do país (não os 10 meses), desta vez na Austrália. Ainda sou do tempo que se fumava nos locais de trabalho – lembro que já procurava as varandas e corredores, mas o facto é que os ambientes (e a roupa) tresandavam a tabaco.

Assim continuei até ao dia seguinte ao aniversário dos 42, quando fui operada para extrair a tiróide. Fumei o último cigarro a acompanhar o café que rematou o almoço e à noite fiz a cirurgia. Não tive qualquer dificuldade em não voltar a fumar. Não fiz esforço de espécie alguma, o que atribuo ao facto de estar apinhada de medicação. Foi o largar de vício mais fácil que se possa imaginar. Como nem tudo são flores engordei mais de 20 quilos, o que para quem já tinha ganhado outros tantos uns anos antes não convinha muito. Mas não há saúde sem senão. O certo é que volvidos sete anos lá consegui arranjar maneira – outra cirurgia – de perder parte substancial do peso ganho (ainda em processo de diminuição). A parte gratificante é ouvir a minha enteada dizer que já não chio a respirar. Para quem como eu viveu em criança os últimos anos do avô com problemas respiratórios graves e tem duas tias com maleitas semelhantes, conseguir fugir da sina é uma meta.

Quando parei de fumar disse comigo própria, como já aqui contei várias vezes, não estar a deixar mas a interromper o vício por 40 anos, para ter possibilidade de lá chegar. A meta são os 82. Pode parecer leviano, mas é uma forma naïf de incentivo para encarar a falta deste gosto. Quanto mais não seja porque tinha mesmo imenso prazer no tabaco. Há cigarros que sabem pela vida (o problema é que por vezes custam a própria vida). Haverá coisa melhor do que partilhar um cigarro?

Começar mal o dia

por Isabel Paulos, em 28.07.22

Comecei a manhã a assistir ao atordoamento de uma pomba cinza que voou contra um vidro a dois metros de mim, indo cambaleante esconder-se no bueiro da rua mais perto. Três metros adiante uma outra já morta no asfalto.

Yanni

One Man's Dream

por Isabel Paulos, em 27.07.22

Agenda

por Isabel Paulos, em 27.07.22

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O tempo não tem sido muito, mas há vários apontamentos na cabeça para explanar na melhor oportunidade. Como não anoto em caderninho nem sequer em blocos de notas digitais, senão aqui mesmo em público no blogue, alguns acabam por ser perder. Não deve ser grave. 

Em Outubro do ano passado aqui dei nota dos meus périplos virtuais de comboio. Além de outros destinos andei vários dias perdida nos Andes à conta de um sonho de miúda. Em Dezembro a SIC começou a apresentar no final do Jornal da Noite a óptima série Comboios do Mundo, que logo elogiei. Apesar do interesse não tenho seguido todas as viagens apresentadas na SIC. Mas hoje entrei a bordo do El Chepe, entre as cidades de Chihuahua e Los Mochis, no México. Mais uma vez, vale a pena.

De resto, há ideias soltas no ar, que gostava muito de me lembrar. Contudo chego ao cúmulo de não ter tempo para as apontar, quanto mais de desenvolver. Vão e vêm do pensamento. Quem me dera que o pin voltasse, mas nem por isso.

(10 minutos depois e de uma conversa para activar a memória.)

Quatro temas. Primeiro. A impressão de inconsistência nas grandes afirmações de conquista. Isto é, sempre que se descreve o sucesso como fruto do esforço e grande acerto nas decisões e caminhos tomados há uma margem de legítima desconfiança. A felicidade costuma resultar mais de descobertas do que conquistas e vitórias. Segundo. Recordar a passagem das décadas e a forma como foram sentidas. Um pouco contra-corrente do que vou ouvindo a outros. Os desastrosos 30. A alegre aproximação aos 40. Terceiro. A nova liderança do PSD. Posso estar enganada mas parece ter caído no goto dos fazedores de opinião - o que corresponde ao expectável. Luís Montenegro, a quem achava alguma graça como líder parlamentar, tem aquele condão bem do agrado dos jornalistas e comentadores de nunca espelhar a realidade tal qual é, mas cumprir a check list de lugares-comuns do quadro mental manipulado aceite pelos jornais. Sabe tornear a realidade para satisfazer os media. Isso infelizmente e para mal do país é o que é tido por facto e o que vende. A ver vamos se continua a receber as palmadinhas nas costas da comunicação social. Quarto. Face a mais uma bolada extra paga hoje para as obras do prédio, a realizar (espero) em Setembro próximo, é possível que a ideia de voltar (ao fim de alguns anos) a arejar fora de Portugal fique novamente adiada. Em rigor também não me apetece muito passear por aeroportos congestionados e aguentar vôos atrasados, adiados ou o diabo a quatro. Já agora, quinto. Viagens. Escrever sobre as viagens feitas? Talvez não, cada vez mais me apetece deixar isso para quando tiver 82 anos e puder acender um cigarrinho. Mas pode ser que um dia destes (daqui a meses, anos ou uma década) escreva a propósito, mais sobre sensações do que descrições. Qualquer coisa ligeira e sem pretensões. Afinal, sexto. Hei-de fazer nova entrada sobre cigarros. Esta sim, já havia pensado.

Ilusão do conhecimento

por Isabel Paulos, em 27.07.22

Há dias, depois de ter dado um bitaite rápido sobre o aumento das temperaturas na Terra, resolvi ouvir por aí, na comunicação social, um reputado cientista português sobre o assunto. Dei por mim desiludida. E coloco-me  a questão da razão para esta sensação de frustração. Sendo uma matéria em que sei pouco ou nada, estou habituada a ficar entusiasmada sempre que oiço cientistas ou gente com interesse e conhecimento na ciência. Sei que isto acontece por me alimentarem daquilo que desconheço. Por aprender. Nada mais sensaborão do que viver a ouvir e ler mais do mesmo. Sucede que senti isso mesmo ao ouvir o cientista. Em 10 minutos talvez nem tanto, limitou-se a atirar quatro ou cinco estatísticas a fazer lembrar os rankings do futebol e a repetir aquilo que oiço há anos os jornalistas afirmarem sobre o efeito estufa induzido pelos altos níveis de dióxido de carbono (até eu papagueio isto sem ter muita noção do que estou a dizer) e a necessidade de utilização de fontes de energia alternativa. Aliás, usou o mesmo tipo de linguagem dos jornais e redes sociais.

Continuo ao pensar que o excesso de informação e o constante papaguear de dados está a afastar-nos do essencial. Da explicação da causa das coisas. Algo está errado quando já não se distingue a locução de um cientista da do cidadão comum não particularmente ilustrado. Não podemos estar todos convencidos que sabemos muito ou tudo quanto é preciso saber. Nem convictos que todos podemos ensinar. Vivemos na ilusão do conhecimento.

Detalhes

por Isabel Paulos, em 27.07.22

Chego ao escritório e dou com os aviões a voar em sentido contrário. Costumam cruzar o meu olhar da esquerda para a direita antes de aterrar no aeroporto. Hoje vêm despedir-se à saída, da direita para a esquerda. É como se andassem em contra-mão. Assim é mais divertido, ainda vão a içar. Pena ser míope e não conseguir tomar conta da posição do trem de aterragem nem das companhias.

(não há o que lhe fazer, em criança levavam-me ao aeroporto para ver levantar e aterrar os aviões; estas coisas ficam.)

Afinal isto é como as plantas, também tem novidades. É por estas e outras que tenho dúvida de querer ficar em definitivo em teletrabalho.

Não há como estar atenta aos pormenores da jornada. Bom dia.

 

Adenda. Logo a seguir voltaram à direcção normal e reparo: se prestar mais atenção, vejo o trem de aterragem. As lâminas do estore cortam um pouco a visão, mas vejo.

Hackers

por Isabel Paulos, em 26.07.22

Que bom. Acabo de ser informada que uma empresa de recursos humanos, à qual há anos forneci dados, sofreu ataque informático, tendo os ditos ficado expostos. Este está a ser um ano brilhante, não haja dúvida.

"A palavra menos obscena nesta música é foder"

por Isabel Paulos, em 26.07.22

Não raro Pedro Abrunhosa encanita-me com as suas opiniões. Não gosto de aproveitamentos para promoção própria.

Mas gosto muito menos de gente sonsa que se mostra sensível a vocabulário obsceno quando absolutamente justificado. Hipócritas, só não são sensíveis às aberrações, à violência, à tragédia, à injustiça.

Inteiramente do lado de Pedro Abrunhosa.

Acrescento: sempre que vejo alguém criticar o Abrunhosa pela falta de voz reparo que não tem a mais pequena noção do que é (boa) música. Gente presa a preconceitos, presumida e obtusa. Aliás, hoje vai a direito, exactamente o que me vai na alma: gente estúpida com a puta da mania.

Mau feitio

por Isabel Paulos, em 25.07.22

Bem sei que sou do contra, mas a propósito da reportagem da SIC sobre o Comboio Histórico do Vouga tudo quanto me apetece dizer é que a monomania das recriações históricas tem o efeito inverso em mim. Até teria curiosidade em fazer o curto percurso de comboio, mas a ideia de levar com teatrinhos e representações para turista ver afugenta-me de tais ambientes.

Em 2016 fiz alguns passeios em Portugal a lugares a perder de conta as vezes que visitei desde criança. Cada um tem os seus pontos fixos de périplos nacionais. Óbidos, Nazaré, Figueira da Foz, Aveiro, Viana do Castelo e Caminha fazem parte dos meus. E corri essas capelinhas no Verão de 2016. A algumas já regressei. O certo é que me lembro de então ter sido brindada com as tais pantominices em Óbidos, cujo único efeito prático é tornar desagradável um passeio que teria tudo para ser bonito e proveitoso.

Já sei, é mau feitio. Mas é como é.

Vhils

por Isabel Paulos, em 25.07.22

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The Mills, Hong Kong - November 24, 2015.

*

Imagem retirada da página oficial de Alexandre Farto, Vhils.

Se tiverem curiosidade, visitem a página. Não darão por tempo perdido.

Don McLean

Vincent

por Isabel Paulos, em 24.07.22

*

Starry, starry night
Paint your palette blue and gray
Look out on a summer's day
With eyes that know the darkness in my soul
Shadows on the hills
Sketch the trees and the daffodils
Catch the breeze and the winter chills
In colors on the snowy, linen land
Now, I understand what you tried to say to me
And how you suffered for your sanity
And how you tried to set them free
They would not listen, they did not know how
Perhaps they'll listen now
Starry, starry night
Flaming flowers that brightly blaze
Swirling clouds in violet haze
Reflect in Vincent's eyes of china blue
Colors changing hue
Morning fields of amber grain
Weathered faces lined in pain
Are soothed beneath the artist's loving hand
Now, I understand, what you tried to say to me
How you suffered for your sanity
How you tried to set them free
They would not listen, they did not know how
Perhaps they'll listen now
For they could not love you
But still your love was true
And when no hope was left inside
On that starry, starry night
You took your life as lovers often do
But I could have told you, Vincent
This world was never meant for one
As beautiful as you
Starry, starry night
Portraits hung in empty halls
Frameless heads on nameless walls
With eyes that watch the world and can't forget
Like the strangers that you've met
The ragged men in ragged clothes
The silver thorn of bloody rose
Lie crushed and broken on the virgin snow
Now, I think I know what you tried to say to me
How you suffered for your sanity
How you tried to set them free
They would not listen, they're not listening still
Perhaps they never will
 

A ler

por Isabel Paulos, em 24.07.22

Manuel Cargaleiro: "Trabalhei tanto… Deve haver poucos pintores que tenham trabalhado tanto. Há um, o Picasso", no Observador.

 

Sou muito otimista e acredito na boa-vontade dos outros.

[...]

Sempre fui muito tímido, mas não tenho vergonha.

[...]

Nesse caso: qual é a sua mensagem?
É difícil dizer. A minha mensagem talvez seja orientar as pessoas para viverem junto à natureza e serem simples. O simples não significa que não conheçam os poetas. Ainda há poucos dias me lembrei do Agostinho da Silva, o filósofo. Passei um tempo em Brasília e ele estava lá, de maneira que à noite passeávamos e falávamos sobre estes temas.

[...[

Que relação tem com a religião ou com a espiritualidade?
Sou católico. Jesus Cristo foi enviado por uma força a que, para facilitar a vida, chamamos Deus. Tive uma relação muito forte com a Vieira da Silva. Na vida, na arte, na conversa. Conhecemo-nos em Paris. Um dia pediu-me para ir almoçar lá a casa, depois fechou-se comigo no atelier. Estava numa crise de confiança. Eu disse: “O Arpad é um grande pintor, muito bom do ponto de vista técnico, e a Maria Helena é uma bruxa genial.”

Que quis dizer com isso?
Que ela era o que era malgré ela. Não foi ela que quis ser artista, aconteceu ser assim. Ela foi intermediária, fez o sacrifício revoltado e sofrido de fazer as obras que fez. Sou exatamente o contrário. Aquela admiração que ela tinha por mim, vinha daí, ela via o contrário na minha obra. Ela sofria. Digo isto porque me falou na religião. Quando se assinalaram 10 anos da morte dela, a embaixada em Paris organizou uma cerimónia, onde até esteve a Maria Barroso. O jovem padre fez um discurso a dizer que a Vieira da Silva não era católica. Fiquei pior que estragado e disse ao padre que durante seis meses tinha ido muitas vezes a casa da Vieira da Silva para lhe ler excertos dos Evangelhos. Ela queria encontrar frases para gravar na pedra do túmulo. Como é que não era católica? Daí aquelas perspetivas que nunca mais acabam. Eu ponho flores, ponho alegria, ela não. Ela procurava o depois, o que há depois. Eu dizia-lhe: “Maria Helena, depois, depois… Depois há Deus.” É aquela força que não somos capazes de explicar por mais voltas que demos.

[...]

É verdade que nos primeiros anos em Paris conheceu Picasso e Max Ernst?
Conheci toda a gente daquele tempo. Com o Max Ernst havia uma amizade, ele era um velhote, eu era um jovem. Ele queria que eu fosse com ele ver exposições, para não estar sozinho. Com o Picasso, foi diferente, nunca falei com ele. Vi-o várias vezes, estive ao lado dele no Café de Flore. Por decisão, nunca me aproximei. Um dia, o Armando Martins Janeira, embaixador de Portugal em Tóquio, chega a minha casa e pede-me para ir comprar três bifes para o jantar, a mulher dele também ia aparecer. Eu morava no número 19, o Picasso no número 7 da Rue des Grands Augustins. Um dia cheguei ao talho e encontrei o Picasso. “Estou diante de um génio.” Não tinha nada para lhe dizer. Diria o quê? Que gostava muito da pintura dele, que ele era um génio? Tudo seria pouco. Senti-me tão pequeno ao pé daquele monstro que nem quis dizer-lhe nada.

Imagine que as pessoas faziam o mesmo consigo: que nem lhe falavam por o admirarem tanto.
Sou a pessoa mais acessível.

[...]

Para terminar: pode dizer-nos qual é o problema da arte portuguesa?
Não quero dizer mal de ninguém, a arte portuguesa tem grandes artistas. Sabe, todos os países do mundo querem ter um ou dois pintores em Paris, todos. Os portugueses que foram para lá nos anos 20 vieram-se todos embora. Malgovernados, com falta de espírito de sacrifício… Os pintores portugueses são fabulosos do ponto de vista técnico, a formação é ótima, têm todas as qualidades para triunfarem em qualquer lado. Mas, quando decidem sair de cá, olham para o que se faz nos outros países e pensam fazer o que veem fazer. Fazem o que os outros já fazem. Sabe qual é o resultado? Passam a ser artistas de segunda, não levam uma coisa nova. Olhe, há um miúdo fabuloso que gosta de mim, até vamos agora fazer uma coisa juntos. É o Vhils. Aquela ideia de picar a parede é admirável, ele tem uma visão de longe fantástica. Há uma profundidade na obra dele que admiro imenso. Ele está a fazer o que ninguém faz.

Já têm estado juntos?
Algumas vezes. Ele é do Seixal, onde há uma escola com o meu nome, e quando era miúdo via os meus trabalhos, porque eu organizava exposições e dava muitas coisas lá para as escolas. À volta da cabeça dele andam imagens das minhas cerâmicas. Fico todo contente, o miúdo tem 35 ou 36 anos. Há uns dias fui ao atelier dele no Barreiro, um pavilhão fabuloso, enorme. Vi lá um painel em madeira, todo pintado de uma cor. Digo-lhe assim: “Isto não está muito bem”. E o Vhils: “Quer pintá-lo? Eu dou-lho.” Portanto, já tenho uma ideia do que fazer, vou acrescentar, e espero trazer o painel aqui para o museu. Ele quer que assinemos os dois. Parece-me bem.

 

Divagações sobre sonho e morte

por Isabel Paulos, em 24.07.22

Em regra os teus sonhos são pacíficos. Com frequência muito povoados de conhecidos e desconhecidos, como já aqui contaste. Alguns divertem-te pelo no sense. Mas há momentos raros em que tens pesadelos. Cada vez menos. Em criança muito pequena arvoravas-te em defensora dos teus irmãos, que em sonhos julgavas mais novos, bebés ainda. A dormir fazias guarda aos manos com armas de meccano. Em novita tiveste de matar um desgraçado que te perseguia e queria fazer mal a um dos teus irmãos. Lembras-te do homem sentado numa esplanada e de disparares a arma em esforço vezes infindas até conseguires apagar aquele olhar persistente de desafio e ameaça. Mataste-o, era o que tinha de ser feito. Resolveste um problema. Fora estes pesadelos, ao longo da vida sonhaste com alguns assaltos às várias casas onde viveste e a coisa ficava sempre pelo suspense. Acordavas ainda no susto. Houve uma altura curta que ao adormecer vias imagens violentas. Questionaste uma médica sobre o assunto. Sossegou-te afirmando que a causa era fisiológica. A maior parte dos sonhos dos últimos tempos são benignos. Houve anos em que transferiste a pulsão protectora para o Nuno: acordavas sobressaltada noites seguidas amparando-o de queda iminente.

Na noite de Sexta para Sábado sonhaste com uma série de andaimes onde repousavam muitos corpos humanos mortos e feridos semi envoltos em cobertores de cor castanha. O que mais te impressionou é que a imagem não te comoveu. Longe do tempo em que eras mais nova e enfrentavas as aberrações estavas impávida a observar, com aquela protecção já tua conhecida de não veres o que dói. Acreditas que seja uma defesa de sensibilidade. Acontece-te na vida real por micro-segundos não assistir a tragédias. É certo que te defendes, olhas como se fosses uma lente que desfoca o corpo ferido ou morto, como tomasses consciência do ocorrido sem a violência do pormenor. Claro que foste ler as interpretações, difíceis de definir, apesar de saberes bem que são as imagens da Ucrânia a razão primeira.

Foges da violência, mas a morte não te assusta em particular. Assististe ao momento da morte da tua avó, de quem tanto gostas e admiras. Encaras a partida com naturalidade. Não é que a desejes, aliás gostarias de como ela chegar a velhinha, mas se viesse agora aceitá-la-ias. Tens sonhos para o futuro, mas não urgência de deixar pegada. Se acontecesse agora irias como se tivesses 10 ou 20 anos. Com devaneios vagos por cumprir. Nada de importante. Não foste aos 33 porque Deus te deu a mão e quis que ficasses. Tudo o que veio daí em diante foi bónus. E é assim que encaras a vida: um bónus.

É claro que te custa a ideia dos teus morrerem. É sobretudo mimo. A sensação de ficar atordoada sem o conforto dos mais queridos. E medo que sofram, claro. Aos quatro ou cinco anos, estando a tua mãe doente (nada de grave) entravas em parafuso. Pedias ao Universo que te levasse a ti primeiro por saber que não a aguentarias perder. Depois cresceste e começaste a aceitar as leis da Natureza.

 

Adenda.

Isto saiu uma mexerufada pouco conseguida. Ainda por cima neste texto deste por ti novamente a ter dúvidas na distinção entre forma pronominal dos verbos e o pretérito perfeito. Mais: ontem esqueceste-te do pin de um cartão e 24 horas depois ainda não conseguiste lembrar. Começa o recorrente cansaço do Verão.

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