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O centro implodiu? Certo. Então, tem que se refazer. A questão certa é como ser capaz de congregar as preocupações de quem não se revê no antigo e degenerado centro. É exactamente aí que a mudança tem de ser feita, em vez da rendição à aparência de radical de direita ou de esquerda, porque os eleitores são muito menos tontos do que se acha.
Faria todo o sentido, em vez das constantes espirais de ridiculização de radicais e populistas – que dão óptimas rábulas humorísticas mas têm efeito nulo em política -, perceber que aspirações satisfazem para atrair eleitorado descontente. E, sendo justas, fazer as devidas concessões sem pudores. Por exemplo, na área do trabalho as injustiças são mais do que muitas e muito há a fazer, sem o preconceito de ir beber ao ideário comunista legítimas reivindicações. Na área da economia só o travão dos liberais ao estrangulamento do mercado pela dependência do Estado ajudaria a amadurecer a iniciativa privada, a deixar de favorecer o Estado como central de emprego e regalias, e à racionalização do papel de redistribuição da riqueza, para por cobro à dependência dos subsídios.
Ao contrário do que se diz, as pessoas que se fartaram do centro e, por isso, votam em radicais, não se indignam contra a liberdade ou respeito pelo Estado de Direito, mas sim contra os interesses instalados, a corrupção, a injustiça e desigualdade no acesso e redistribuição da riqueza. Legitimamente fartaram-se de serem comidas por lorpas. E querem ver mudança. Então, mude-se para melhor o centro, que bem precisa. E esvazie-se o espaço para radicais.
A política está além da sofisticação da análise e dos grandes prognósticos. Às vezes o que está certo e dá resultado no futuro é (simplesmente) o que está certo, contra todos os vaticínios. RR - ou outro que queira vir a ser primeiro-ministro - não tem que sair do centro para agradar à direita, dando aparência apetecível a esse eleitorado. Tem que mudar o centro com ideias e políticas correctas e justas para satisfazer legítimas aspirações dos concidadãos que querem mudança para melhor nas suas vidas.
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O problema do PSD foi o mesmo do CDS, a impossibilidade ou vergonha de se ser afirmativamente de direita no País que a história recente marcou como certo o lado esquerdo da barricada. Foi extraordinariamente difícil às hostes de direita afirmarem-se abertamente, sob pena de serem fustigadas com impropérios pela opinião influente.
Depois de tantos anos de relativo silêncio – com a ténue excepção dos anos dourados do cavaquismo onde a direita se descobriu após as facilidades de acesso ao crédito e a vida melhorada – e, agora, com a vaga dos populismos de direita europeia, seria natural que a nossa direita pusesse os corninhos o sol e ganhasse protagonismo. Mas, por cá, nem assim. Por não haver viabilidade prática para uma direita não populista. Ou seja, à direita o Chega tem por onde crescer, o CDS sem um Paulo Portas nem por isso e o PSD só terá a perder.
Supondo a hipótese de haver significativa massa silenciosa que acredite em contas verdadeiramente certas e transparentes, no escrutínio das instituições, na isenção e celeridade da justiça, na ascensão por mérito, na igualdade de oportunidades, na justiça salarial, na garantia de segurança dos cidadãos, na manutenção do serviço nacional de saúde universal e eficaz, etc. (porque estas são as questão que interessam ao comum cidadão), a questão que se colocará a seguir é saber o que levará alguém a votar no PSD e não no PS (ou no CDS ou no Chega).
Dir-se-á que o PSD estará mais à direita se defender uma economia livre, mas será isso impeditivo de ao mesmo tempo defender uma maior justiça salarial? É isso que invalida votos no PSD? Só por ser bandeira de esquerda? A maioria do eleitorado deixa de votar no PSD por esta razão. A esquerda tem o monopólio da defesa e justiça dos direitos dos trabalhadores? Ou seja, para quê encostar o PSD à direita se o espaço do centro é o terreno natural deste partido?
A menos que as ideias não interessem nada e na política dos nossos dias valha apenas a aparência. Se for esse o caso, então, RR que se diga de direita populista desde pequenino, que minta tudo quanto pode e depois actue em consciência e em desconformidade com o que apregoou.
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Ainda que as políticas a defender não tenham que estar entrincheiradas – aliás, não devem -, a geometria ideológica ajuda muito a reconhecer o ponto de partida das posições e por muito que não se goste ou ache primária a dicotomia esquerda/direita ela subsiste e explica muito.
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